Certo é
que não se conhece um livro pela capa.
Contudo,
é igualmente certo que pelos frutos se conhece a planta. Pois não pode a
tamareira produzir damascos; nem o pessegueiro ofertar outro fruto, além dos pêssegos
que gera.
E, se
assim é, aquele que deseja damascos não deve esperar que possa encontrá-los na
tamareira; nem deve o que busca tâmaras desperdiçar o seu precioso tempo com o
pessegueiro.
Porque
cada um não pode oferecer senão o que tem em si mesmo. E sensato é o homem que
não espera o impossível; nem acredita que a sua vontade possa mudar as leis da
natureza.
Sempre
vos deixais, todavia, levar pelas aparências. E descuidai-vos de observar as ideias, os
gestos e as atitudes das pessoas, quando seduzidos estais por seu porte ou sua
beleza.
Entretanto,
embora o luar sobre as areias do deserto em ouro pareça transformá-las, areias
continuam a ser; e as águas azuis do oceano, apesar de seu encanto, não saciam
a vossa sede.
Esta é a
verdade. E de nada vos serve quedar-vos em frente ao oceano, se sedentos
estiverdes; melhor fareis em buscar águas frescas e potáveis, que vos
possam dessedentar.
Pois, ainda que
à vossa vaidade agrade a ilusão de possuir o oceano, não são as suas ondas que vos saciarão a sede inclemente, mas a água bendita e amiga do poço
escuro e humilde.
Não
deveis obstinar-vos em perseguir o que acreditais desejar; mas utilizar as
vossas forças, para obter o que realmente necessitais. Aprendei esta lição e
melhor aproveitareis a vida.
Libertai-vos
do jugo das aparências. E recordai que, se o belo não é necessariamente o melhor,
nem o feio o pior, o inverso também acontece; não é, pois, pelos olhos que deveis
julgar.
É pelas
obras, que se julga o homem; como é pelos frutos que se conhece a planta e
pelos conceitos que vos transmite, que deveis avaliar um livro. Evitai ceder à
cegueira comum da visão.
Porque
não é apenas com os olhos da face, que podeis enxergar; mas também com os do
espírito. E aquele que não os utiliza é como o caolho, que se nega a usar a visão
que lhe resta.
Aprendei
a usar a vossa visão. Ainda que não consigais, no início, ver longe, podeis
tentar enxergar o que está perto de vós; aos poucos, sereis capazes de enxergar
mais e mais.
Deixai-vos
seduzir pelo belo; mas não a ponto de à beleza vos escravizardes. Porque a
vossa felicidade não está nas pessoas ou coisas que vos cercam; é em vós, que ela
nasce.
E dela
não vos deveis afastar.