A CANÇÃO DA CARIDADE
Abrigai em vós a caridade.
Para que não vos ofenda a máscara da fome, no rosto de vossos irmãos; nem o desespero da mão vazia que se estende, e muitas vezes colhe apenas o desprezo e o sarcasmo.
Para que a esperança possa amparar a criança abandonada, e encontrar abrigo no coração do idoso desassistido; para que o homem volte a crer em si mesmo.
A caridade sincera não é senão o Amor, despido de todo egoísmo e envergando as suas vestes mais nobres; na alegria de servir, encontra a própria recompensa.
Pois o homem generoso é como a árvore dadivosa, que faz da doação de seus frutos a razão de sua sobrevivência. Para ele, como para a árvore, reter é perecer.
E é como o rio, que fertiliza a terra às suas margens. Ao seu redor, os amigos se multiplicam; a fama de sua bondade o precede, e os anjos o receberão entre eles.
Enquanto o avarento afunda no lamaçal do próprio egoísmo, que o impede de compartilhar os bens e a alegria, e trava os seus passos no caminho do aprendizado.
Porque o medo exagerado da miséria o faz passar privações desnecessárias e suportar o tormento da sede, para economizar o alimento da sua despensa farta e a água do seu poço cheio.
E, quando chegar o seu dia, os anjos lhe voltarão as costas; e o Universo lhe pedirá contas dos bens que lhe foram dados, para que mais leve se tornasse a jornada comum.
Pois, assim como a nuvem recebe de volta a água da chuva que do chão se evapora, aquele que serve aos seus irmãos receberá multiplicados os haveres que à caridade destinar.
Tende presente esta verdade, quando na próxima esquina a criança carente vos estender a mão desamparada; e em voz trêmula, ou no silêncio eloquente da fome, apelar à vossa bondade.
Lembrai-vos, então, de vossos próprios filhos. E não vos limiteis à oferenda apressada do alimento, ou de uma simples moeda, mas envolvei-a em vosso carinho e fazei-a sentir o vosso amor.
Pois é a vós que cabe fazer brilhar em seu sorriso a luz da esperança; ou apagar de seus olhos a crença no homem e acender em seu coração a chama ardente da revolta.